Por Murilo O. Barbosa, advogado
Na dinâmica frenética da sociedade atual, encontrar profissionais confiáveis e flexíveis às rotinas de trabalho é tarefa complexa e essencial. No caso dos profissionais que atuam dentro dos lares, especialmente aqueles com a presença de crianças ou idosos que requerem cuidado especial, dormir no local de trabalho muitas vezes é a alternativa mais viável para quem contrata.
Governantas, auxiliares de limpeza, zeladores, jardineiros e cuidadores são algumas das profissões que se inserem nesse contexto de empregados ou trabalhadores domésticos.
É importante conhecer as consequências jurídicas da situação em que o profissional dorme na residência onde exerce sua atividade.
A primeira pergunta é: mesmo com as mudanças legislativas mais recentes, ainda é possível que o trabalhador durma onde trabalha? A resposta é sim. Mas os requisitos foram atualizados nos últimos anos, alterando o contexto que foi muito comum no Brasil no século passado.
Antes de mais, é preciso “passar tudo a limpo”, ou seja, ter clareza nas características do dia a dia do trabalho. Isso inclui combinar, mediante acordo – preferencialmente escrito –, a duração da jornada de trabalho, as folgas, férias e até mesmo a possibilidade de horas extras ou acúmulo de horas para compensação (dedução) posterior.
A Emenda Constitucional n. 72, de 2013, determina que os empregados domésticos tenham o mesmo tratamento, quanto à duração da jornada de trabalho, dado os demais empregados regidos pela CLT. Desse modo, o fato de não deixar o local de trabalho não pode ser sinônimo de trabalho ininterrupto.
A legislação determina que a jornada de trabalho seja no máximo de 44 horas semanais. As horas extras não podem exceder 2 horas diárias e a compensação de horas deve ser feita na mesma semana em que houve o acúmulo de horas laborais. A exceção fica por conta das hipóteses de acordo individual ou sindical em que se admita um banco de horas para a categoria.
O empregado doméstico ainda tem direito a gozar de uma folga a cada seis dias de trabalho, preferencialmente, no domingo. E, obrigatoriamente, pelo menos um domingo por mês.
De modo geral, deve-se também preservar seu direito constitucional a pelo menos uma hora de descanso para jornadas maiores que 6 horas, além de 15 minutos para alimentação e descanso a cada 4 horas de trabalho.
Ainda é comum deparar com situações do cotidiano à margem da lei. É preciso ter cuidado, já que sujeitam o empregador ao pagamento de indenizações, com seus reflexos nas verbas trabalhistas.
Se a quantidade de horas diárias trabalhadas excede o limite legal, é devido o pagamento de horas extras (valor 50% acima do normal). Se as horas extras são feitos no período de repouso (entre 22h e 5h), haverá novo acréscimo de 20% na hora como adicional noturno. Até mesmo aquelas “tarefinhas” realizadas fora do expediente podem configurar regime de sobreaviso e ensejar o pagamento de adicional de prontidão (correspondente a 2/3 do valor previsto para a hora diária).
Outro aspecto relevante no tema é saber que a regra geral – além, naturalmente, do cumprimento da lei – é o diálogo. É fundamental o diálogo permanente entre empregador e empregado, certificando-se o empregador de que o profissional está de acordo com os termos estabelecidos, seus direitos e deveres. Até mesmo os avisos patronais mais comuns, como o horário de almoço do empregado, o pedido para trabalhar em um dia/horário diverso do habitual ou mesmo em dia que coincida com algum feriado oficial (quando a jornada é paga em dobro, ainda que incompleta) devem todos ser atos consentidos pelo trabalhador.
Importante ainda lembrar que o contexto em que o trabalhador dorme no local de trabalho é diferente da não interrupção do trabalho (ou trabalho ininterrupto), o revezamento de jornada (12h de trabalho e 36h consecutivas de descanso) ou o pacto de trabalho intermitente – em que o pagamento das verbas é feito com base apenas nas horas efetivamente trabalhadas.
Por fim, ressalte-se que o trabalhador não perde o direito ao vale-transporte referente aos dias em que precisa fazer o trajeto casa-trabalho e vice-versa. Ademais, é expressamente proibido descontar do salário do funcionário quaisquer valores referentes a alimentação, moradia ou mesmo o uso de produtos de higiene pessoal e limpeza em geral.
Compreendendo melhor hoje os aspectos legais desse modelo de contratação, evita-se cair em problemas e litígios judiciais no futuro.