O início da contagem do período da licença maternidade quando a criança é internada em UTI neonatal

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Por Gabriela Queiroz Cardoso

 

A licença maternidade tem a sua origem na intensa necessidade que o recém-nascido tem de sua mãe nos primeiros meses de vida. Como se sabe, salvo em situações excepcionais, a alimentação do infante até os primeiros dois anos de vida deve ser baseada no leite materno. Até os seis primeiros meses, essa alimentação deve ser exclusivamente de leite. Mesmo em casos específicos, em que não há aleitamento materno, o ser humano não consegue sobreviver aos primeiros meses de vida se não puder contar com um amparo constante, notadamente de sua mãe. Portanto, o direito da mãe de se licenciar do trabalho pelo período de 120 dias é, principalmente, para suprir as necessidades básicas de seu filho.

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagemEsse direito está sedimentado no Ordenamento Jurídico Brasileiro e não há qualquer discussão a respeito dessa licença, que pode ser pelo período de 120 ou 180 dias. O que se passou a questionar nos últimos anos é a data de início de contagem desse prazo.

O Brasil ainda conta com altas taxas de nascimento de prematuros. Essas crianças precisam de cuidados médicos específicos e muitas vezes ficam longos períodos internadas em UTI Neonatal. Nesse período hospitalar, nem sempre a mãe pode ficar em contato direto com o seu filho.

Nesse sentindo, é fato que aquela convivência da criança com a genitora nos primeiros dias de vida – fundamental para assegurar o desenvolvimento físico, psíquico e emocional saudável da infante – fica prejudicada, visto que o bebê não conta com o integral convívio com a sua genitora.

A internação prolongada de bebês com problemas de saúde impede a concretização de uma das finalidades da licença maternidade que é a de convivência e estreitamento do laço afetivo entre a mãe e os filhos.

No Poder Judiciário, a questão tem sido tratada a partir do Princípio do Melhor Interesse da Criança, pelo  qual  as  decisões devem   ser   tomadas   considerando   o   que   atende   ao   melhor interesse da criança, o que inclui o recém-nascido, para quem têm que ser asseguradas as melhores condições possíveis para a sua vida e desenvolvimento. Dessa forma, tem sido cada vez mais aceito nos tribunais brasileiros que a contagem da licença maternidade tenha o seu termo inicial quando da alta da criança do hospital.

O Princípio do Melhor Interesse do Menor respalda o adiamento do termo inicial de licença maternidade em casos que as crianças recém-nascidas sejam encaminhadas para a UTI. Assim, o início da licença maternidade deve ocorrer a partir da saída do recém-nascido da UTI, e não da data do parto.

Por conseguinte, a mãe terá 120 dias com seu filho em casa para poder dispensar todos os cuidados necessários, como também para criar os laços afetivos necessários para o bem desenvolvimento da criança.

Algumas Unidades da Federação têm apresentado entendimentos próprios quanto ao tema. No Distrito Federal, por exemplo, no caso de a mãe ser servidora pública distrital, o período de internação do bebê está sendo computado como licença por motivo de doença em pessoa da família, nos termos do artigo 130, inciso II, da Lei 840/2011.

Desse modo, enquanto o bebê está internado, a licença maternidade não começa a ser computada, fato que ocorre apenas quando da alta hospitalar do infante. Na percepção do Judiciário local, a medida assegura às servidoras públicas que tiveram filhos prematuros ou que necessitaram de um longo período de internação a possibilidade de ficarem aos 120 dias em casa com suas crianças.

Mesmo assim, esse entendimento jurisprudencial ainda não foi sedimentado no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, de modo que alguns magistrados ainda não o aplicam. Por esse motivo, foi instaurado um incidente de uniformização de jurisprudência, ainda não julgado pelo Egrégio Tribunal.

No que tange à iniciativa privada, a Justiça do Trabalho[1] também está adotando a tese de dilação da licença-maternidade pelo período de internação do recém-nascido com vistas ao Princípio do Melhor Interesse da Criança.

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagemA modulação do termo inicial para contagem do período de licença-maternidade tem ocorrido no sentido de se conferir maior concretude e reforçar a garantia da essência do dispositivo constante do art. 7º, XVIII, da Constituição Federal.

Assim, uma vez que a licença maternidade das mães sofreu alteração em vista de a criança demandar mais cuidados da genitora, também em casos de prematuros que ficaram internados na UTI Neonatal deve-se seguir o mesmo entendimento.

O Congresso Nacional Brasileiro está atento ao assunto. Em março de 2019, foi aprovado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 472/2019, que prorroga o início da licença-maternidade nos casos de internação do bebê após o parto. A lei visa a consolidar o entendimento dos tribunais brasileiros para que o termo inicial da licença maternidade seja o dia da alta hospitalar da criança.

Além do mencionado Projeto de Lei, está em tramitação perante o Poder Legislativo, em fase inicial, a PEC 99/2015, que estende o benefício de licença-gestante, em caso de nascimento prematuro, à quantidade de dias de internação do recém-nascido. A referida emenda já foi aprovada pelo Senado Federal, com grande possibilidade de aprovação final, e comprova a importância da matéria, a ponto de provocar a iniciativa do Constituinte Derivado.

[1]Alguns processos julgados perante o TRT10 no ano de 2019. Processo n. 0000673-13.2019.5.10.0102; Processo n. 0000076-93.2019.5.10.0021; Processo n. 0001111-43.2018.5.10.0015.

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